Não sou de contar histórias de encantar, começadas por “Era uma vez …” nem coisa parecida, mas certas histórias merecem ser contadas …
Era o primeiro dia de aulas na cidade, e todas as crianças estavam entusiasmadas.
O que mais se via nesse dia, era um grande número de crianças aos pulos, de mão dada com os seus pais de modo a não fugirem com tanto entusiasmo. Eram às centenas as crianças que se dirigiam na mesma direcção para o seu primeiro dia de aulas.
Estava eu sentado num banco na paragem do autocarro perto da escola, a ler o meu jornal e á espera do meu transporte matinal para ir trabalhar.
Os pais chegavam de carro á escola, e em passo de corrida deixavam os seus filhos no portão e voltavam a entrar no carro, saindo a uma velocidade estonteante. Provavelmente, estariam apressados para irem para os seus trabalhos monótonos e repetitivos.
Um considerável número de crianças não partilhava do mesmo entusiasmo da larga maioria e corria de volta para os seus pais a chorar.
Eu, que com tanta euforia estava quase que obrigado a observar tudo isto , olhava para estas crianças e lembrava-me do meu primeiro dia de aulas .
De um momento para o outro, dei pelo meu olhar a recair uma pequena rapariga que estava encostada ao portão da escola.
Não deveria ter mais que um metro e trinta centímetros. Tinha uns cabelos loiros encaracolados que reflectiam a luz dos raios de sol que se impunham nesta manhã de Setembro. Os seus cabelos contrastavam de forma harmoniosa com os seus olhos azul-turquesa e com a sua pele clara.
Reparei que a sua mãe lhe acenava um adeus á porta do seu carro que se encontrava do outro lado da estrada, mas a rapariga parecia distante e o seu olhar não estava cá.
De repente, a rapariga sai numa arrancada louca em direcção á sua mãe, não olhando para a estrada.
De m momento para o outro, apareceu um carro na faixa esquerda da estrada, a uma velocidade alucinante.
Só se ouviu uma travagem, o som de pneus a rasparem no asfalto e por fim um grito que ecoou por uns bons trinta metros.
Toda a euforia que se notava anteriormente esvaneceu-se.
Um silêncio tumultuoso instalara-se naquele espaço.
A mãe da menina correu em direcção ao local onde ela se encontrava e pegou nela ao colo, esvaída em lágrimas.
O condutor tentou fugir mas um grupo de pais travou-o antes que ele ligasse o carro.
Uma considerável porção de sangue escorria pelos braços daquela mãe que segurava a sua filha nos braços.
O meu autocarro apareceu.
Levantei-me mas estava quase que petrificado com tudo o que tinha acabado de ver.
Tudo isto aconteceu numa fracção de segundos.
No dia seguinte, quando fui esperar de novo o meu autocarro, ainda tinha bem presente na memória o que tinha acontecido quase vinte e quatro horas antes.
No vidro da paragem, já estava exposta a foto daquela rapariga.
Às vezes é complicado para mim perceber como a vida pode dar uma volta de 180º em tão pouco tempo.
É estranho e difícil de compreender, mas é mesmo assim.
Fiquei ali a observar o papel durante longos minutos, enquanto esperava o autocarro.
A rapariga chamava-se Ana Sofia …
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